terça-feira, 29 de março de 2011

Fulton J. Sheen – Sobre o Egoísmo




“Resoluções morrem novas, como acontece aos bons.”

“Primeiro jejum, depois a festa.”

“O amor por nós próprios é o começo de um romance que dura a vida inteira.”  (Oscar Wilde)


Por Saulo Eleazer
     Graças a Deus, a Igreja Católica tem podido oferecer ao mundo excelentes autores. Um deles é Fulton Sheen.
No texto abaixo, o escritor nos apresenta interessantes reflexões que – acreditamos - muito ajudarão nossos leitores. Oportunamente teremos o prazer de disponibilizar aos amigos do blog outras reflexões do mesmo autor por nós indicado.

Maria Santíssima, rogai por nós!

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CAPITULO XIX

“A Característica da criança é a ausência de qualquer intervalo entre o desejo e a sua satisfação. Logo que uma necessidade, um ímpeto se apoderam do espírito da criança, logo ela procura satisfação imediata. Esta é uma das razões por que as crianças choram com tanta facilidade. Quando essa característica se mantem na vida do adulto – muitas vezes assim sucede – podemos realmente chamar-lhe infantilidade. Observa-se isto, sobretudo em adultos que, quando sentem a necessidade de fumar um cigarro, ficam infelizes até satisfazerem o seu desejo. Quantas pessoas haverá no mundo, capazes de negarem a si próprias a satisfação de fumar um cigarro, só como prova de autodomínio, ou porque desejam oferecer o mérito do sacrifício pelo amor de Deus e pelos pecadores do mundo? 
Todo ser humano é propenso ao egoísmo. Oscar Wilde disse uma vez: ‘O amor por nós próprios é o começo de um romance que dura a vida inteira. ’ O egoísmo pode manifestar-se na jactância, na vã vaidade em procurar o melhor lugar à mesa, em aborrecer os outros – porque um massador já foi descrito como o homem que nos priva da solidão, sem jamais servir de companhia. Nunca se viu pessoa alguma que monopolizasse a conversa, sem correr o risco de a tornar monótona. Uma rapariguita, numa festa, ao ver outra convidada mesmo na sua frente pegando numa fatia de bolo, exclamou: ‘Que gulosa tu és; pegaste na fatia maior! Era a que eu queria para mim’.
Quando os excessos começam a manifestar-se, pouca gente há capaz de tomar a resolução de contrariar os seus desejos; todavia a resolução é a única coisa mais forte ao nascer do que em qualquer outra altura. As resoluções morrem novas, como acontece aos bons. O egoísmo manifesta-se por meio do orgulho, ambição, luxúria, gulodice, inveja e preguiça. A idéia básica desta filosofia é que devemos satisfazer todas as nossas vontades a todo o momento, e, já que este mundo é a única coisa que possuímos, devemos extrair dele quantos prazeres nos for possível obter.
Devemos lembrar-nos que existe outra filosofia ao lado do egoísmo. Esta outra filosofia pode resumir-se toda no princípio: primeiro jejum, depois a festa. A filosofia do egoísmo dá a primazia à festa, e deixa para o dia seguinte as renúncias e os lamentos. A filosofia do autodomínio crê no autodomínio, isto é, crê que cada um pode e deve ser capitão e senhor do próprio destino, se tiver vontade firme. A filosofia do egoísmo significa que só os outros devem se mandados. Formas externas de escravidão, tais como maus hábitos, propensão excessiva para as bebidas, acabam por fazer prisioneiro o eu, pois não existe unidade interna para opor ao exército invasor. Logo que a tentação se apresenta, a personalidade sucumbe.
A melhor definição da filosofia da autodisciplina e do autodomínio é-nos dada por Nosso Senhor, a quando duma visita feita pelos Gregos. Os Gregos não se dedicavam à filosofia do prazer como acontece com a nossa civilização ocidental; em todo caso não podiam compreender sacrifício ou amor, capazes de sofrimento em busca de um lucro maior, todo espiritual; o seu sistema desconhecia os dois extremos. Aproximaram-se primeiramente de Filipe, talvez por este vir de uma cidade que havia sido influenciada pela civilização grega, talvez também porque o seu nome era grego. Diziam os gregos qual seu desejo de ver Nosso Senhor. Por sua vez, Filipe comunicou este desejo a André, detentor também de um nome grego. Houve então uma conferência entre os dois apóstolos com nomes gregos. Não sabemos qual o motivo por que os Gregos ousaram pretender ver Nosso Senhor. Pode ser porque Ele dissera que o templo seria casa de oração ‘para todas as nações’. Resolução tão revolucionária deve ter agitado os Gregos, que escutaram um dia estas palavras de Alexandre: ‘Deus é pai comum de todas as nações. ’ Não sabemos precisamente por que motivo queriam encontrar-se com Nosso Senhor, mas é-nos lícito supor que vinham solicitar a resposta que Ele lhes deu.
Provavelmente, disseram-lhe que anteviam para Ele cólera, crescendo cada vez mais, ira e decerto a morte à Sua espera. Pode ser que Lhe dissessem: ‘Se ficardes aqui, morrereis e a vossa vida como Mestre em breve terminará. Vinde para a nossa grande cidade de Atenas, a cidade dos homens sábios. Só uma vez matamos um dos nossos mestres, Sócrates, e nunca mais deixamos de lamentar essa morte. Se vierdes connosco é bem natural que organizareis um estado como o de Sólon ou abrireis uma escola de Peripatéticos, como fez Platão, tão grande é a vossa ciência, ou então podereis fazer reviver e criar dramas à moda de Ésquilo. Todos os conhecimentos, toda filosofia, tudo o que é intelectualidade no mundo veio a nós. Vinde connosco. Sentai-vos no Areópago e viveremos a ouvir-vos. ’
Eis decerto o teor das palavras dos Gregos, pois Nosso Senhor respondeu-lhes assim: ‘ Para o Filho do Homem chegou o momento de concluir a obra da sua glória. Acreditai-me, quando vos digo: um grão de trigo tem de se sepultar na terra e morrer, ou nunca será mais do que um grão de trigo; mas, se morrer, dará rico fruto. Aquele que ama a sua vida perdê-la-á, aquele que desprezar a própria vida neste mundo salvá-la-á, e viverá eternamente. ’ Nosso Senhor disse aos Gregos: ‘Vós não desejais que eu permaneça aqui; quereis que salve a vida. E eu digo-vos que há duas coisas que podeis fazer a uma semente. Podeis comê-la ou podeis semeá-la. Se a comerdes, dar-vos-á um prazer momentâneo. Se a semeardes, sofre, é crucificada, é enterrada na terra; mas multiplica-se e ressurge numa vida nova. Deixai que vos diga que me considero a semente. Não vim ao mundo para viver; vim para morrer. A morte para o vosso Sócrates foi um obstáculo; interrompeu os seus ensinamentos. Para mim, porém, a morte é o alvo da minha vida; é o alvo que procuro. Sou o Único que jamais viveu a vida de trás para diante. Vim para morrer como a semente; assim como vós admirais o homem que dá a vida voluntariamente para salvar um outro homem de morrer afogado, também eu vim para morrer, de maneira a poder salvar a humanidade. Eu não sou um homem como os outros; sou Deus e homem. Não sou um Mestre. É por isso que me convidas para que eu vá a Atenas ensinar. Mas eu sou essencialmente o Salvador, o Redentor. É possível que tenhais escutado o Sermão da Montanha e agora desejásseis ouvir pregar em Atenas esta sabedoria. Não sabeis que existe íntimo e absoluto parentesco entre a montanha das Bem-aventuranças e o Monte do Calvário?’
‘Que venha alguém a um mundo freudiano e diga: ‘ Bem-aventurados os limpos de coração’, e será crucificado. Que venha alguém ao mundo atômico e diga: ‘ Bem-aventurados os mansos’, e trespassar-lhe-ão mãos e pés com cravos agudos. Que venha alguém ao mundo endoidecido à busca do prazer, e diga: ‘Bem-aventurados os que sofrem perseguições’, e coroá-lo-ão de espinhos. Não vos vanglorieis que me pouparíeis a vida se eu fosse para Atenas; dentro de um ano, a minha sentença de morte estará escrita em grego sobre minha cruz. A morte não será, porém a morte. Ninguém pode tirar-me a vida. Sou eu que me despojo da vida. Enquanto viver, a minha existência é semente por plantar, valiosa em mim, mas quando, como semente for plantado no terreno do Calvário, então desenvolver-me-ei em novas vidas, em aumento sempre constante. Este aumento não virá a despeito, mas sim em virtude da minha morte, que será seguida pela Ressurreição. Esta é a minha glória. ’”


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(O negrito é nosso)
Referência Bibliográfica:

SHEEN, Fulton. A Vida Faz Pensar. Trad.: Maria Henriques Osswald.  Porto: Editora Educação Nacional, 1956. 280 pg.




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