quinta-feira, 12 de abril de 2012

Perguntas e Respostas sobre os casos de anencefalia

Dado a relevância do tema e às várias dúvias e sofismas que vão surgindo (mesmo por parte de pessoas que se dizem católicas) por causa do julgamento do STF com relação ao aborto de crianças com anencefalia, divulgamos:
Adaptação
por Thiago Santos de Moraes
36. Tem sentido a mãe manter uma gravidez, se não há qualquer possibilidade de vida após o parto, como no caso de fetos anencefálicos? Nesse caso, não é melhor o “aborto eugênico”, que liquida logo os que não têm possibilidade de sobreviver e poupa a mãe de uma gestação inútil?

Admitir o princípio de que se deve “liquidar logo” os que não têm possibilidade de sobreviver é escancarar as portas não só ao aborto, mas à própria eutanásia.
A previsão de que a morte natural ocorrerá em breve prazo não justifica que ela possa ser antecipada por uma intervenção direta com a finalidade específica de provocá-la.
O desejo de livrar a mãe do desconforto de uma gravidez cujo resultado será um natimorto também não justificará a antecipação violenta dessa morte, pois isto não tiraria ao aborto o caráter de assassinato.
Pelo fato de ser tão básico, o direito à vida do nascituro deve ter precedência sobre outros direitos da mãe, do mesmo modo como acontece com o direito à vida de um filho nascido. Pois nunca será lícito a uma mulher matar seus filhos nascidos, seu marido ou seu patrão, mesmo que estes venham a tornar sua vida penosa.
Ademais, quando os abortistas falam de fetos com anomalias graves, o conceito deles é muito amplo.
O médico abortista Thomas Gollop, que confessou ter feito abortos em fetos anômalos, em certo trecho de uma entrevista à Folha de São Paulo (24/6/94), afirmou que em cinco casos de anomalias, entramos com pedidos para realizar abortos e fomos atendidos.
O repórter então perguntou:
- Casos de anencefalia nos fetos?
- Não, não! Um se referia a uma anomalia cardíaca, outro a uma anormalidade de coluna…
Também é expressivo o testemunho dado pelo jurista Celso Bastos, renomado constitucionalista brasileiro, em entrevista a ótima revista Catolicismo (nº 525, setembro/1994):

Participei de uma discussão em que um médico, dono de diversas clínicas, defendia o aborto. Dizia ele que, com uma aparelhagem de ultrasom, pode-se saber com 80% de certeza se o feto é mongolóide, e que nesse caso, poderia ser abortado. Perguntei se, já que admitia 20% de incerteza, por que não deixar nascer a criança e depois trucida-la ao vivo? Então haveria 100% de certeza. Ele não teve resposta e ficou irritado.


Na foto acima, a anencefala Marcela de Jesus que viveu por 20 meses recebendo o cuidado da mãe.
37. Mas o anencéfalo não nasce morto? O governo não decidiu que eles podem ser abortados?

Não, não nasce. O anencéfalo não é um “natimorto cerebral”.
Aliás, todas essas denominações estão erradas. O correto é falar em morte encefálica e o encéfalo, por sua vez, é composto pelo cérebro, o cerebelo e o tronco cerebral. Os bebês anencéfalos, embora não tenham o cérebro, ou boa parte dele, têm o tronco cerebral funcionando. Este é constituído principalmente pelo bulbo, que é um alongamento da medula espinhal, e controla importantes funções de nosso organismo, entre as quais a respiração, o ritmo dos batimentos cardíacos e certos atos reflexos (como a deglutição, o vômito, a tosse e o piscar de olhos).
O Conselho Federal de Medicina, ao regular o transplante de órgãos, em sua Resolução nº 1480 de 08/08/1997, diz sobre a morte clínica:
a parada total e irreversível das funções encefálicas equivale à morte
Portanto, aqui não se fala só de cérebro.
Vale a pena transcrever aqui um trecho de um manual de Neurologia Infantil de autoria dos professores da Faculdade de Medicina da USP Aron Diament e Saul Cypel:

A MF [má formação] consiste na ausência ou formação defeituosa dos hemisférios cerebrais pelo não fechamento do neuroporo anterior (…). Geralmente, a criança nasce fora do tempo, às vezes com poliidrâmnios [excesso de água na bolsa amniótica, fato que ocorre também em gravidezes em que a criança é normal] e seu período de vida é curto: dias ou até poucas semanas, como já vimos em alguns casos (…). Responde a estímulos auditivos, vestibulares e dolorosos. Apresenta quase todos os reflexos primitivos do RN[recém-nascidos]. Além de elevar o tronco, a partir da posição em decúbito dorsal, quando estendemos ou comprimimos os membros inferiores contra o plano da superfície em que está sendo examinada (manobra de Gamstorp).
Sobre o anencéfalo recém-nascido, assim se pronuncia Eugene F. Diamond, M.D., professor da Pediatries Loyola University Stritch School of Medicine (Management of a Pregnancy With na Anencephalic Baby):

O anencéfalo não é de fato ausente de cérebro, uma vez que a função do tronco cerebral está presente durante o curto período de sobrevida. Muito pouco se conhece sobre a função neurológica do recém-nascido anencéfalo. Um recente estudo em profundidade indica que eles estão funcionalmente mais próximos dos recém-nascidos normais do que de adultos em estado vegetativo crônico.
O estudo a que se refere o autor é feito por Shewmon, D.A., Anencephaly, Selected Medical Aspects, Hastings Center Report 18:11, 1988.

Acerca da consciência do anencéfalo, o Comitê de Bioética do Governo Italiano diz (Comitato nazionale per la bioetica. Il neonato anencefalico e la donazione di organi. 21 giugno 1996):
O encéfalo do recém-nascido parece hoje comparável cada vez mais a um cérebro adulto em miniatura, principalmente pelas funções de consciência e de contato com o ambiente, e cada vez mais comparável a um órgão em formação com potencialidades variáveis. A perda ou a falta de uma parte do cérebro durante a fase de desenvolvimento não é comparável à perda da mesma parte depois que o desenvolvimento se tenha acabado completamente.
Não se trata, obviamente, da possibilidade por parte do tronco de suprir as funções do córtex faltante, mas de admitir que a neuroplasticidade do tronco poderia ser suficiente para garantir ao anencéfalo, pelo menos, nas formas menos graves, uma certa primitiva possibilidade de consciência. Deveria, portanto, ser rejeitado o argumento de que o anencéfalo enquanto privado dos hemisférios cerebrais não está em condições por definição, de ter consciência e provar sofrimentos.
Comparemos a anencefalia com a calvície. Se podemos definir, grosso modo, anencefalia como “ausência de cérebro”, poderíamos definir calvície como “ausência de cabelo”. Mas, o homem calvo não tem realmente cabelos? Nem mesmo um fio? Em geral eles tem numa quantidade pequena. Mas, então, que número de fios faz um calvo? Cem fios? Duzentos fios? Mil fios? Qual o número que divide calvos e não-calvos?
Nota-se que a resposta é impossível. Pode-se, porém, recorrer à genética e dizer que calvo é aquele que apresenta o gene da calvície, mesmo que os cabelos não tenham começado a cair. Só que a anencefalia não é genética, ela é uma má-formação adquirida, não uma congênita. Assim, como definir anencefalia? Ausência total de cérebro ou de uma parte dele? E qual a máxima parte de cérebro que separa anencéfalos de bebês normais?
Essa pergunta não tem resposta. E se o objeto não pode ser definido, o Judiciário sequer devia cogitar a tomada de alguma decisão sobre a questão. Um objeto indeterminado não pode ser apreciado.
Todavia, os abortistas não se deram por vencidos e, por incrível que pareça, o Conselho Federal de Medicina (CFM), entrando em contradição, aprovou em 08 de setembro de 2004 uma resolução (Resolução 1752) que permite arrancar órgãos de recém-nascidos anencéfalos mesmo com o tronco cerebral ainda funcionando.
O Dr. Herbert Parxedes (laureado pela Academia Nacional de Medicina), em 10 de setembro de 2004, escreveu criticando duramente a novíssima resolução do CFM:
Em 20 de dezembro de 1991 eu mais 80 professores da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense enviamos ao Conselho Federal de Medicina um abaixo assinado em que protestávamos contra a pretensão daquele Conselho de propor lei que liberaria o aborto para gestações de fetos que apresentassem alguma má-formação, o que, em bom português, se chama aborto eugênico. Apesar de nunca termos recebido qualquer resposta do CFM, a idéia, ao que parece, tinha sido abandonada. Engano meu! O CFM, 13 anos depois, volta à carga, desta vez com uma Resolução em que permite, isto é, torna lícita a retirada de órgãos de crianças anencefálas, nascidas vivas, desde que com a anuência de seus pais.
Na Resolução 1752/2004, o CFM, a seu bel-prazer, mudou conceito de morte encefálica para morte cerebral, contrariando o estabelecido em lei (Lei 9434/1997 – Lei dos Transplantes). Tal resolução que autoriza homicídios é ilegal e o médico que resolver extrair órgãos vitais de um anencéfalo recém-nascido, além de se condenar ao Inferno, responderá por crime de homicídio.
Tudo isso foi uma orquestração dos abortistas para quebrar a visão do anencéfalo como um ser humano.
O citado comitê de bioética italiano tem uma opinião diferente do CFM:
O anencéfalo é uma pessoa vivente e a reduzida expectativa de vida não limita os seus direitos e a sua dignidade.
A supressão de um ser vivente não é justificável mesmo quando proposta para salvar outros seres de uma morte certa. (Na foto acima, a anencefala Júlia que viveu por poucas horas recebendo o carinho da mãe).
38. Se o anencéfalo está vivo, por que uma pessoa com morte cerebral pode ser considera “morta” e ter seus órgãos retirados para transplantes?
Uma criança “sem cérebro” tem vida, mas essa situação não pode ser comparada aos casos em que se declara “morte cerebral num adulto”.
Por que não?
Porque num caso nos temos um ser cuja vitalidade é crescente numa etapa (durante a gestação) e decrescente noutra (o anencéfalo não nasce morto, morre após nascer). O cérebro, aqui, não é um indicador de vida ou morte, já que a vitalidade crescente existia independente dele ser bem ou mal formado.
Em relação ao outro caso, o do adulto, a “morte cerebral” só é levada em conta como indicador de morte porque o cérebro vai ser o referencial da vitalidade, ou seja, vai dizer quando as funções corporais atuam em conjunto (vida) ou quando isso não mais ocorre (morte). Para um adulto isso é possível pois a comparação é com o estado anterior, onde o cérebro realmente funcionava como integrador.
No corpo com morte cerebral as partes ainda tem uma espécide de vida, a vida sensitiva ou vegetativa, mas a vida intelectiva, caracterizada pela presença da alma e indicadora do ser, não se faz presente, já que tudo fica desarticulado.
39. Isso não o mesmo que dizer que a vida deve ser considera por etapas?
Não, não é. O critério para verificar a vida varia sim segundo as diferentes etapas da existência do organismo, mas é evidente que a vida é uma só.

Trecho retirado de 'Catecismo sobre o Aborto', que é uma adaptação (ampliação e atualização) feita por Thiago Santos de Moraes pelo livro 'Aborto 50 perguntas e resposta em defesa da vida inocente', de 1996. O Catecismo sobre o aborto pode ser visualizado na integra em: http://apologeticacatolicablog.blogspot.com.br/2010/04/catecismo-sobre-o-aborto.html