sexta-feira, 12 de julho de 2013

Ano da Fé e Grupos de Estudos – parte I


Por Pietro Mariano dos Santos

“Meu povo se perde por falta de conhecimento.” (Oséias 4,6)

A – Ano da Fé em tempos de crise

O “Ano da Fé”, proclamado por Bento XVI[1], é uma grande resposta às necessidades do tempo presente. As palavras do Papa em um seu documento[2] referentes à “Porta da Fé” [3] - que nos introduz na única e verdadeira Igreja de Cristo - são, para bom entendedor, uma conversão ao mais essencial da eclesiologia tradicional, infelizmente abandonada por tantos pseudo-teólogos da modernidade.

Não é segredo para ninguém a evidente manobra de certo ecumenismo modernista, que pretende a Igreja Católica como, tão somente, “mais uma” instituição ao lado de todas as outras que se dizem cristãs. Nessa falsa perspectiva teológica, “tanto faz” ser católico ou não, pois “o mais importante é o amor” – dizem. Como se fosse possível a caridade sem o concurso da verdadeira revelada pelo Pai através de Cristo à Sua Igreja. “A fé sem caridade não dá fruto, e a caridade sem a fé seria um sentimento constantemente à mercê da dúvida”. (Porta Fidei, Bento XVI, n.14).

Estamos perante a mais completa rejeição de um dogma Católico: “Extra Ecclesiam nulla salus” (Fora da Igreja não há salvação); proclamado, não só por Inocêncio III (1208), como também no Concilio Lateranense IV (1215) e no Concilio Florentino (1442). Graças a Deus, tal verdade fora ultimamente retomada por J. Ratzinger em “Dominus Iesus”, para espanto dos “progressistas”. Sobre esse tema central afirmara o Cardeal Giacomo Biffi:
“À luz destes testemunhos, não se vê como se possa contestar o principio: ‘fora da Igreja não há salvação’, a menos que se relativize toda doutrina eclesial e se considere que não existe no âmago da concepção católica nenhum ensinamento certo e irrevogável.” [4]

Porém as loucuras não param por aqui...

Outros vão ainda mais adiante em sua revolta: além de afirmarem o “tanto faz” ser católico ou pertencer a qualquer outra suposta “igreja cristã”, chegam a defender que nem mesmo o cristianismo seria tão necessário assim, uma vez que poderíamos pertencer a qualquer outra religião (Judaísmo, Budismo, Islamismo, Hinduísmo etc.). Defendem-se afirmando que “Deus é o mesmo” (Sic) e que, portanto, qualquer religião seria válida. A centralidade do cristianismo para esses “moderninhos paz e amor” seria um ato orgulhoso de padres e bispos “quadrados”, “fechados” e fundamentalistas.



Ora, vá dizer a certo tipo de Maometano que Alá é “Pai e Filho e Espírito Santo”, e tente voltar vivo para nos comunicar sua resposta...
Sobre este ponto, assevera-nos Bento XVI que crer em Jesus é o caminho para se chegar definitivamente à salvação. Ele é, de acordo com o atual para emérito, o único salvador do mundo (Porta Fidei, Bento XVI, n.6).

É por vermos idéias tão distantes da verdade, que entendemos um pouco mais a decadência atual. Além disso, somente um número reduzido de cristãos têm tido a ousadia de pregar destemidamente a fé de sempre (Porta Fidei, Bento XVI n. 8).  Tal carência na evangelização acaba por impedir a muitos de cruzarem o limiar daquela Porta que nos conduz ao batismo na única Igreja realmente fundada por Nosso Senhor. Afirmamos assim – “realmente fundada” – porque a lábia modernista de alguns padres (é com tristeza que o dizemos) tem enganado aos incautos com a falsa doutrina de que a Igreja Católica estaria tão somente “fundamentada em Cristo”. Isso equivale a defender que o catolicismo não foi - segundo eles - de fato, histórico e objetivamente, fundado pelo Filho de Deus.
“Já não nos defrontamos com adversários ‘em pele de cordeiro’, mas com inimigos aberta e desavergonhadamente assumidos na nossa própria casa, os quais, tendo feito um pacto com os maiores inimigos da Igreja, estão decididos a arrasar a fé [...]” [5] (S. Pio X)

Eis o motivo de vermos tantas “velhinhas bondosas” ensinando aos seus netinhos por aí sandices como esta: “Não, meu filho, Jesus nunca fundou uma Igreja... isso é coisa dos homens. A gente só vai à missa porque é bom cada pessoa ter sua crença. Eu vou morrer católica porque nasci nessa ‘lei’.”

Alguns anos depois...
Olha lá a velhinha com seu netinho pulando e dançando - apesar da osteoporose e Cia - em cultos protestantes ou terreiros de macumba...

Acima, "missa sertaneja' em uma famosa rede de tv católica. Abaixo, o "pastor fazendeiro" ($$$), Waldomiro Santiago.
 Semelhanças não são mera coincidência. 
Deste modo, aumentam-se as convulsões que se seguiram após o Concilio... Um a um, como em fila bem organizada, vão saindo uns pobres fiéis da Igreja Católica e se perdendo em seitas dos mais variados tipos: não auscultaram a fé de sempre, e, se a ouviram, ela não lhes plasmou o coração pela graça...

S.S. Paulo VI vira no Ano da Fé por ele proposto em 1967 uma conseqüência e exigência do período pós conciliar. Ele estava ciente das graves dificuldades daquele tempo, sobretudo no que se referia à profissão da verdadeira Fé e da sua reta interpretação (Porta Fidei, Bento XVI, n. 5). Com efeito, chegara ao ponto de afirmar que, por alguma brecha, a fumaça de satanás entrara na casa de Deus.

O atual papa emérito, reiteradas vezes, quis dar-nos a entender que os textos do Concílio Vaticano II devem ser conhecidos e assimilados no âmbito da Tradição da Igreja. “Se o lermos e recebermos guiados por uma justa hermenêutica, o Concilio pode ser e tornar-se cada vez mais uma grande força para a renovação [...]” [6]

Essa proposta nos faz recordar as sábias palavras de São Vicente de Lérins, citadas pelo antigo Arcebispo de Paris, o Cardeal Suhard, (que, infelizmente, auxiliava os padres Chenu e De Lubac, apesar de seu modernismo manifesto):
“Mas, dir-se-á talvez, não é a religião susceptível de qualquer progresso na Igreja de Cristo? Seguramente que sim, e muito grande. Quem seria bastante inimigo da humanidade, bastante hostil a Deus, para lhe tentar opor? Mas, com uma condição indispensável: que se trate verdadeiramente de um progresso da fé e não da sua alteração. Pois o próprio do progresso consiste em que um ser se desenvolva permanecendo ele próprio; enquanto a alteração consiste em que uma coisa se transforme em outra [...]” [7]

Cristo Rey
Caso um legítimo progresso na doutrina (claro, pela ação do Espírito Santo) - sem alteração - não seja realizado hoje em lugar do que tem ocorrido, o mundo continuará se afastando daquele ideal tão bem representado no auge da Idade Média (Século XIII). Está evidente na atualidade, para qualquer observador, o quanto a sociedade dista do projeto católico onde Cristo exercerá Seu Reinado Social. “Enquanto no passado era possível reconhecer um tecido cultural unitário, amplamente compartilhado no seu apelo aos conteúdos da fé e aos valores por ela inspirados, hoje parece que já não é assim em grandes setores da sociedade devido a uma profunda crise de fé que atingiu muitas pessoas.” (Porta Fidei, Bento XVI, n. 2)

Essa situação preocupante exige de nós uma atitude. É o que meditaremos na segunda e última parte deste nosso artigo. Peçamos a Nossa Senhora do Bom Conselho que nos proteja e ilumine por sua doce intercessão nos caminhos desta vida de lutas e dificuldades.

Virgem Santíssima, ora pro nobis!
Maria Sempre!




[1] O ano da fé teve inicio aos 11 de outubro de 2012 (cinqüentenário da abertura do Concílio Vaticano II) e se estenderá até 24 de novembro de 2013.
[2] Porta Fidei, sobre a o Ano da Fé, S.S. Bento XVI.
[3] Conf. At. 14,27
[4] BIFFI, Giacomo. Para amar a Igreja. Trad. Socorro Coelho. B. H., Ed. O Lutador, 2009, p. 79
[5] S.S. Papa São Pio X, Sacrorum Antistitum.
[6]  S.S. Bento XVI, Discurso à Cúria Romana (22 de dezembro de 2005)
[7] SUHARD, Cardeal. Triunfo ou declínio da Igreja. Lisboa, 1947, p. 66.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Feliz aquela que acreditou

D. Ghirlandaio: La visitación
(cf. Lc 1, 45)


58. Na parábola do semeador, São Lucas refere estas palavras com que o Senhor explica o significado da « terra boa »: « São aqueles que, tendo ouvido a palavra com um coração bom e virtuoso, conservam-na e dão fruto com a sua perseverança » (Lc 8, 15). No contexto do Evangelho de Lucas, a menção do coração bom e virtuoso, em referência à Palavra ouvida e conservada, pode constituir um retrato implícito da fé da Virgem Maria; o próprio evangelista nos fala da memória de Maria, dizendo que conservava no coração tudo aquilo que ouvia e via, de modo que a Palavra produzisse fruto na sua vida. A Mãe do Senhor é ícone perfeito da fé, como dirá Santa Isabel: « Feliz de ti que acreditaste » (Lc 1, 45).

Em Maria, Filha de Sião, tem cumprimento a longa história de fé do Antigo Testamento, com a narração de tantas mulheres fiéis a começar por Sara; mulheres que eram, juntamente com os Patriarcas, o lugar onde a promessa de Deus se cumpria e a vida nova desabrochava. Na plenitude dos tempos, a Palavra de Deus dirigiu-se a Maria, e Ela acolheu-a com todo o seu ser, no seu coração, para que n’Ela tomasse carne e nascesse como luz para os homens. O mártir São Justino, na obra Diálogo com Trifão, tem uma expressão significativa ao dizer que Maria, quando aceitou a mensagem do Anjo, concebeu « fé e alegria ».[49] De facto, na Mãe de Jesus, a fé mostrou-se cheia de fruto e, quando a nossa vida espiritual dá fruto, enchemo-nos de alegria, que é o sinal mais claro da grandeza da fé. Na sua vida, Maria realizou a peregrinação da fé seguindo o seu Filho.[50] Assim, em Maria, o caminho de fé do Antigo Testamento foi assumido no seguimento de Jesus e deixa-se transformar por Ele, entrando no olhar próprio do Filho de Deus encarnado. 

59. Podemos dizer que, na Bem-aventurada Virgem Maria, se cumpre aquilo em que insisti anteriormente, isto é, que o crente se envolve todo na sua confissão de fé. Pelo seu vínculo com Jesus, Maria está intimamente associada com aquilo que acreditamos. Na concepção virginal de Maria, temos um sinal claro da filiação divina de Cristo: a origem eterna de Cristo está no Pai — Ele é o Filho em sentido total e único — e por isso nasce, no tempo, sem intervenção do homem. Sendo Filho, Jesus pode trazer ao mundo um novo início e uma nova luz, a plenitude do amor fiel de Deus que Se entrega aos homens. Por outro lado, a verdadeira maternidade de Maria garantiu, ao Filho de Deus, uma verdadeira história humana, uma verdadeira carne na qual morrerá na cruz e ressuscitará dos mortos. Maria acompanhá-Lo-á até à cruz (cf. Jo 19, 25), donde a sua maternidade se estenderá a todo o discípulo de seu Filho (cf. Jo 19, 26-27). Estará presente também no Cenáculo, depois da ressurreição e ascensão de Jesus, para implorar com os Apóstolos o dom do Espírito (cf. Act 1, 14). O movimento de amor entre o Pai e o Filho no Espírito percorreu a nossa história; Cristo atrai-nos a Si para nos poder salvar (cf. Jo 12, 32). No centro da fé, encontra-se a confissão de Jesus, Filho de Deus, nascido de mulher, que nos introduz, pelo dom do Espírito Santo, na filiação adoptiva (cf. Gl 4, 4-6).

60. A Maria, Mãe da Igreja e Mãe da nossa fé, nos dirigimos, rezando-Lhe:


Ajudai, ó Mãe, a nossa fé.

Abri o nosso ouvido à Palavra, para reconhecermos a voz de Deus e a sua chamada.

Despertai em nós o desejo de seguir os seus passos, saindo da nossa terra e acolhendo a sua promessa.

Ajudai-nos a deixar-nos tocar pelo seu amor, para podermos tocá-Lo com a fé.

Ajudai-nos a confiar-nos plenamente a Ele, a crer no seu amor, sobretudo nos momentos de tribulação e cruz, quando a nossa fé é chamada a amadurecer.

Semeai, na nossa fé, a alegria do Ressuscitado.

Recordai-nos que quem crê nunca está sozinho.

Ensinai-nos a ver com os olhos de Jesus, para que Ele seja luz no nosso caminho. E que esta luz da fé cresça sempre em nós até chegar aquele dia sem ocaso que é o próprio Cristo, vosso Filho, nosso Senhor. 

[49] Cf. Dialogus cum Tryphone Iudaeo, 100, 5: PG 6, 710.
[50] Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. sobre a Igreja Lumen gentium, 58.
Trecho final da Encíclica Lumen Fidei, de Sua Santidade Papa Francisco, publicada em 05/07/2013. Site do Vaticano.