sábado, 20 de fevereiro de 2010

Desobedecer, se necessário for!

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Theotokos (Mãe de Deus) de Vladimir
 
Prof. Pedro M. da Cruz.
 
Muitas vezes temos que desagradar aos homens para obedecer a Deus. Em situações banais, se assim podemos dizer, isso se dá de modo mais tranqüilo. De fato, quem não se afastaria dos companheiros, por exemplo, quando esses decidissem, democraticamente, que todos deveriam ver filmes pornográficos? Ou mesmo, quem não se colocaria abertamente contra o aborto numa roda de conversa, por ser esta questão evidentemente contrária à doutrina cristã? É óbvio que me refiro aqui a católicos verdadeiros, e não aos hipócritas que usam da religião como uma máscara, imaginando poder zombar de Deus. Esses, falam uma coisa e vivem outra; vão à Santa Missa por mera desculpa; não escutam uma única frase do sacerdote, e ainda se entretém em olhar freneticamente ao redor de si - até mesmo na sagrada fila da Comunhão - invejando os calçados e as roupas alheias, procurando maliciosamente sorrizinhos soltos... nem preciso me estender demais nesta questão, pois, os leitores estão fartos de ver estes tipinhos envergonhando a Igreja de Cristo.
Porém, a situação torna-se mais complicada quando somos obrigados a desobedecer a alguém que amamos com particular afeto; quando somos obrigados, pela consciência, a desobedecer aos pais, ao padre, ao Bispo... Ah, como dói no coração esta possibilidade. No entanto, uma vez que é o amor a Deus que o exige, deve-se estar pronto para tudo, até mesmo a desobedecer; e com alegria! Sim, porque a Deus deve-se amar sobre todas as coisas!
Disseram os santos apóstolos aos judeus que os haviam aprisionado: “Julgai vós mesmos se é justo diante do Senhor abedecermos a vós mais do que a Deus. Não podemos deixar de falar ...[1]. Realmente, se a justiça é a virtude de dar a cada um a parte que lhe cabe, jamais poderemos furtar-nos de entregar a Deus um coração submisso e filial, uma vida correta e santa. Esta é a parte que lhe é devida! Assim, amando a Deus de todo o coração, com toda alma e com todo o entendimento, cumpriremos com a Justiça.
O cânon 753 do Código de Direito Canônico, nos afirma que os Bispos - quer individualmente, quer reunidos nas Conferências ou em concílios particulares - embora não gozem de infalibilidade no ensinamento, são autênticos doutores e mestres dos fiéis a eles confiados, desde que se achem em comunhão com o Sumo Pontífice e os membros do Colégio episcopal. Neste caso, os cristãos estão obrigados a aderir, com religioso obséquio de espírito, a esse autêntico magistério de seus Bispos.
Mas, e quando um Bispo não estiver em comunhão com o Santo Padre, o Papa? E quando ele agir de forma contrária aos ensinamentos católicos? Estaremos obrigados a obedecer aos conselhos errôneos daquele que ensina a mentira e a engano? Claro que não! De igual maneira, um padre que pretendesse colocar-se acima do Magistério da Igreja, ensinando doutrinas condenáveis, não poderia jamais ser obedecido ao proclamar suas heresias.[2] Brademos, pois, com radicalidade: obediência pronta ao autêntico magistério de nossos pastores, e desobediência heróica a todos aqueles que ousarem se revoltar contra a Igreja! De fato, mesmo sendo oficial o ensinamento ordinário de cada Bispo, ele, no entanto, não é infalível. É possível que, um ou outro, venha a cair em erro, o que nos comprova a própria história do cristianismo.
Em circunstâncias tão dolorosas, o primeiro dever do fiel consiste em manter todo o respeito à pessoa sagrada do Pastor que lhe foi dado pela Providência, e acatar-lhe filialmente as ordens, em tudo quanto não obste à fidelidade direta e mais alta que se deve ao Vigário de Cristo.[3]
Exemplo de santa intolerância e radicalidade perante o erro, nos é narrado por Dom Mayer numa de suas Cartas Pastorais. Citando o caso de Nestório, um dos grandes heresiarcas da história, fala-nos que, no natal de 428 d.C, ano de sua eleição ao trono episcopal, aproveitando a grande multidão que se aglomerava na Basílica Catedral, ele – Nestório – anunciara terrível blasfêmia contra Nossa Senhora: “Maria – dizia ele em sua pregação - não deu a luz a Deus; seu filho não era senão um homem, instrumento da divindade”. Grande frêmito de horror percorreu os ouvintes, e um leigo, vejam bem, um leigo, Eusébio, levantando-se do meio da multidão protestou vivamente contra a impiedade do senhor Bispo. Sabemos que toda a História se alegra, até hoje, com a atitude heróica deste homem que soube defender a doutrina cristã. Que este exemplo de amor à verdade possa fecundar em nossa alma intenso ardor pela ortodoxia.
Finalmente, peçamos a Nossa Senhora a graça duma virtude heróica ao cumprirmos nosso dever apologético. Reconheçamos que, no tesouro da Revelação, há pontos essenciais cujo conhecimento necessário e guarda vigilante todo cristão deve possuir, em virtude de seu título de cristão, independente de pertencer ou não à hierarquia da Igreja. Os verdadeiros fiéis são aqueles que extraem de seu Batismo, nas circunstâncias mais urgentes, a força necessária na luta contra a falsidade e a mentira.

[1] Atos dos Apóstolos 4, 19-20
[2] Chama-se heresia a negação pertinaz após o Batismo, de qualquer verdade que se deva crer com fé divina e católica, ou a dúvida pertinaz a respeito dela.
[3] MAYER, D. Antônio de Castro. Por um cristianismo autêntico. Editora Vera Cruz, 1971. Pg. 115.

3 comentários:

João disse...

"Nossa! Excelente meu amigo Paulo L.!
Expressou bem o discernimento e atitude que devemos ter para algumas situações tão delicadas e às vezes até corriqueiras em nossas paróquias. Parabéns!

"peçamos a Nossa Senhora a graça duma virtude heróica ao cumprirmos nosso dever...""

Manoel Carlos disse...

Muitas vezes temos medo de desobedecer e sermos condenados, mas realmente algumas vezes isso se torna uma coisa urgente. Acredito que esse teme está bem exposto. Me ajudou muito para reflexão. Desobedecer sim ,mas só se for necessário.Parabéms ao Blog.

Anônimo disse...

Talves o melhor seria deixar para a Igreja esssas questões. a maioria dos catolicos se confundira muito nessas situações.mas é verdade que agente pode reclamar da igreja quando ela comete algun erro atraves de seus superiores.